NÃO QUERO BICHO!

 – Canta as horas aí pra mim, meu querido? Eu sei, já lhe perturbei demais, eu sei. Só mais essa vez e eu lhe prometo ficar caladinho no meu canto esperando a moça voltar. Dez e trinta e sete? Tá certo. Obrigada. Dez horas e trinta e sete minutos, trinta e sete minutos… sete. Sete é número bom não é? É o número de Deus! Acho que isso é bom então. Dez e trinta e sete. Se bem que já deve ser dez e trinta e oito agora. Você poderia… Ah o senhor já tá indo embora? Tá bom então, deixa pra lá. Mas olha só que cachorrinha mais lindinha desse mundão! Tá até sorrindo! Oi garota. É garota né? Sabia! Eu sei essas coisas só de olhar. Ela é muito bonitinha viu? Tá de parabéns! Da pra ver que você cuida muito bem dela porquê ela tá com rosto feliz, tá vendo? Aqui ó! Ó o sorrisão! Essa é bem cuidada, dá pra ver pelos olhos, dá sim. Animal é sincero né, o animal que é sincero de verdade. O cachorro quando não é bem cuidado vive com cara de triste pedindo carinho pra estranho. É triste demais sabe, triste demais. Eu pareço assim durão, eu sei, mas essas coisas mexem com a gente né? Não tem saída não, uma vez que você deixa um bichinho entrar na sua vida, lascou. Olha só minha situação, tive que improvisar uma gaiolinha de gato com duas cestas de compra do mercado lá do outro lado da rua. Eu precisava trazer o Afonso aqui de algum jeito. E a gente da um jeito pra tudo né não? Pedi pro menino lá ” Me dá essas cestinhas quebradinhas?” pois então, amarrei com uma fitinha e prontinho. Gaiolinha de graça! O que a gente não faz pela família, né não moço? Já é da família ele já. Quando você menos percebe já tá deixando fazer o que quer, e fala “É da família”. Mas é mesmo sabe, seu moço. É da família. E daí passa o tempo, todo animalzinho que você olha na rua vira um possível familiar. Coisa doida não? Já reclamei muito. “NÃO QUERO BICHO!” Daí acaba deixando um, aí vem outro, e outro… Nunca imaginei que depois de um tempo eu estaria em uma veterinária esperando um gato que eu peguei semana passada na rua terminar um tratamento! E num é qualquer tratamento não senhor! Coisa séria, sabe. Mas tem que ajudar né não? Eu ajudo de verdade, sabe porquê? O senhor sabe, claro. A gente ajuda um filho! Num vai ajudar o bichinho que é família? Eu ajudo mesmo, sabe lá o que pode acontecer amanhã com ele. Eu tenho pra mim que bicho é melhor que gente. Gente tem maldade no coração, bicho é diferente, Deus não deixou isso acontecer entre os bichos. Não é a toa que Deus salvou todos os bichos no barco do Moisés e só chamou a família do Moisés pra cuidar do barco. Eita, espera… foi Moisés né? O moço que cuidou dos bichinhos no barco? Bom, isso nem importa, o que importa é que se não fosse o bicho homem, o Afonso não ai ter pavor de entrar na água! Porque essa coisas vem no corpo sabe moço, é coisa de DNA isso aí. Bicho tem memória ancestral! Tudo culpa do Moisés! Ah, Afonso é o nome do meu gatinho que tá lá no tratamento, sabe? Não combina muito com ele não, mas na ficha acabou ficando assim. A moça secretária perguntou o nome e eu falei na hora “Afonso uai” e ela escreveu lá. Só depois que eu fui entender que ela queria o nome do gato e não o meu. Agora tá isso mesmo. Afonso. Afonso, o gato. Afonso, o gato do Afonso. Eu até gostei. Minha esposa não deixou eu dar o nome do meu filho de Afonso porquê é nome de velho. Falei pra ela que uma dia o moleque ia chegar na idade de combinar com o nome, mas ela não gostou não. Ficou Guilherme mesmo, é bonito sabe, Guilherme… mas é meio esnobe pro meu gosto. Seu nome não é Guilherme não né moço? Que alívio. Minha esposa fala que eu não posso falar essas coisas na frente das pessoas porquê pode causar confusão, ainda bem que o senhor não se chama assim. Ela tá é certa, tenho eu ouvir ela mais vezes. Ela bem disse, “cuidado com o Afonso que ele foge” e eu não liguei. O danado fugiu!  Isso que dá pegar um gato de idade já. Tem que pegar quando ele é novinho, porque aí não sente falta de vadiar. Quer dizer, vadiar ele até vadia né, mas vadiar dentro de casa é menos pior né não? Quando ele some na rua eu fico nervoso. Ele não pode faltar o tratamento. A doutora aqui, ela é muito boa doutora sabe, ela disse que se ele faltar muito, o tratamento não vai fazer efeito e o Afonso não vai se acostumar com os efeitos. Ele passa muito mal depois sabe, sai todo babado! Mas tem dia que não dá, ele foge mesmo. Foge, foge mesmo. E ao mesmo tempo é muito engraçado. É muito engraçado porquê todo mundo sai de casa correndo feito doido gritando “AFONSO!” Aí eu já não presto mesmo, falo logo ‘TÔ AQUI UAI!” Todo mundo me xinga, é engraçado demais. E logo depois a gente acha ele umas duas esquinas na frente de casa. Ele gosta de ir pro bar. Fica lá com os desiludidos, bebendo as nove da manhã. Eu já falei que achei esse gato já com idade? Então, eu tenho pra mim que ele já viu muita coisa nessa vida. Não é normal ver um gato ir pra um bar assim desse jeito, sem mais nem menos. Esse já teve sua dose de problema, o senhor sabe como é né? É… Ele vai sair dessa, vai sim. Mas não é bom perder o bichinho não, sabe. Dá muita dó. Num gosto nem de pensar que.. Ah o senhor já tá indo né. Deixa que eu abro a porta pro senhor,  isso.. deixa comigo. Vai na paz moço! Continua assim cuidando tão bem da sua bonitinha! Oh vida. Deixa eu sentar de novo então…

Opa moça, a senhora podia me dizer as horas?

 

humanoides – Saga de Mavis Bo

– Fracassados! – ela repetia quantas vezes fossem necessárias até toda a raiva esvair completamente de seu corpo, mente, espirito. – Vão ver! Nunca, nunca, nunca, NUNCA MAIS ponho meus pés nesse planeta!

Da sala do pensador, o céu abria cada vez mais. O ar de suas narinas bufantes contra o vidro, se espalhava cobrindo a imagem do pequeno planeta que há alguns minutos atrás esbanjava autoridade pelo tamanho e forma. Agora apena a luz emitida pelo planeta, uma luz fraca e cinzenta, sumindo enquanto Mavis Bo se dirigia cada vez mais em direção ao negrume do espaço. Deu as costas ao planeta Nébula 919. Mavis Bo não tinha certeza de muitas coisas depois de fugir desse lugar. Morrer pareceu uma ótima opção caso colocassem as mãos nela outra vez. Principalmente agora. Precisava proteger sua vida, finalmente tinha entendido o motivo pelo qual estava viva.

Correu. Correu todo o perímetro da nave. A resposta estava bem ali, sabia. De cabine em cabine procurou por pistas da resposta que havia encontrado em Nébula 919. Toda sua jornada até o deplorável planeta teria valido a pena se ele estivesse lá dentro.

– Talvez, se eu tentar chamar… Isso é ridículo. Mas, e se… Ninguém entrou na nave, eu me certifiquei disso. Então eu posso gritar o quanto eu quiser! Não é? Isso não faz sentido, estou falando sozinha?! Qualquer um me ouviria, estou falando sozinha! CRIANÇA HUMANA! CADÊ VOCÊ?!!

Gritou enquanto corria pelos corredores. Gritou enquanto andava entre as demais cabines. Um total de duzentas cabines. Gritou por três refeitórios, gritou até suas cordas vocais falharem e depois se jogou no chão, de braços abertos entre o corredor que leva até as cabines reservadas os clientes dispostos a gastar bem mais pelo mínimo de conforto.

 – E chamam isso de cabine VIP. – ela zombou olhando na direção de um dos quartos – Nunca vou cansar de repetir isso. FRACASSADOS!

Depois da fuga, Mavis Bo procurou pela criança humana correndo pelo navio roubado e não percebeu o quanto cansada estava até cair no chão. Suas pernas não respondiam, chegaram ao limite depois de dois dias andando praticamente sem parar. Seu corpo desejava parar. Uma fração de hora desligada e recarregaria o suficiente para mais meio dia de busca. Seu corpo implorava por isso, podia sentir. Seus dedos, das mãos e pés, tremiam em movimentos involuntários e contorcidos como que entrando em curto. Os braços e pernas latejavam em locais alternados, locais esses que assumiram tons avermelhados como aviso de que um pouco mais e estaria derrotada. A cabeça travou na posição mais desconfortável possível, levantada em direção ao quarto “VIP”

– Mais que merda.

Tinha domínio das pálpebras e fechou os olhos bem devagar, vendo a imagem da cama VIP logo a frente desvanecer. Só podia respirar, e ficou assim por uma eternidade. Podia ouvir o som metálicos de seus dedos estalando freneticamente.

“Que situação Mavis, vergonhosa” ela pensou. Tentou levantar a voz, mas de que adiantaria? “Olha só para você. Eu sei que está cansada, mas descanso é recompensa. Você não está em condições de recebe-la não é mesmo? Não até achar essa criança! levanta desse chão agora. Você consegue. Só mais um pouquinho, e essa criança está salva.”

Respirou fundo como se pudesse puxar todo ar da nave de uma só vez.

– E adivinha quem vai salva-la? – sua voz havia dado sinais de algum resquício de força. – Sim garota, você vai… você vai salvar todo mundo! Vai salvar a droga do MUNDO!

“Lembra o que a louca da Janis falou uma vez…?” uma voz pesada, forte, invadiu sua cabeça.

Mavis se concentrou. Focou nos dedos dos pés, mas sua cabeça respondeu primeiro, caindo para trás provocando um som oco e metálico no chão.

– “just a little bit harder” – ela cantarolou baixinho. O som dos metais na sua cabeça a desafiavam a mover os benditos dedos. As mãos ainda estalavam, Mavis Bo deu ritmo a elas. Do ritmo veio o controle e os pés logo responderam, assim como o todo o corpo.

Se pôs de pé com um pulo e um grito – TRYYYYYYYYYYYY! – e correu.

Os gritos de “Criança humana!” foram automaticamente substituídos por xingamentos. Xingou a viagem, Xingou nébula 919 e seus governantes com insultos dos mais criativos em alto bom som. Xingamentos arcaicos que havia a aprendido com seu mentor séculos atrás vieram na sua cabeça como uma bala, a direcionando tanto pelos corredores já vistos como os novos também. Os xingamentos eram abafados apenas por silvos e frases como “EU VOU SALVAR ISSO TUDO, TUDO!”

Mavis Bo sentiu uma nova energia invadindo o corpo como uma onda, como um choque elétrico. Tinha plena noção do quão ilusória a situação parecia, e usaria isso em seu favor. Procurou identificar algo semelhante a uma entrada ou porta escondida. Se a criança não estava ao alcance de seus olhos estaria ao menos ao alcance de suas mãos. A cabine do comandante da nave foi sua primeira escolha, optou em começar a errar do mais óbvio.  “Esses autômatos não são nada originais, Mavis” a voz em sua cabeça respondeu.

Prestou atenção a voz.

– Nada originais – repetiu ao observar a sala de comando, estranhamente pequena para uma nave desse porte. Entendia o funcionamento de naves, não se considerava uma grande conhecedora, mas sabia usar uma quando necessário. Como de fato o fez. Quando ligou a nave, fez isso pelo controle de voz da Sala do Pensador, o salão privado onde apenas os chefes daquela operação teriam acesso e garantiu que a voz do comandante fosse emulada com perfeição. Nada podia dar errado. Entretanto o acesso de fúria após a partida a distraiu, e desabilitar cada robô da nave fora o trabalho mais minucioso já feito por ela, sem mencionar cansativo. Não tinha dedicado tempo suficiente aquela cabine.

– Cabine, aqui é CON919A3 – Mavis disse assumindo a voz que havia roubado do comandante. Logo pequenas luzes de cores específicas adicionaram ao painel iluminado em tom de verde. Sinais em azul, com símbolos de ondas. Vermelhos cravados em um  clássico sinal que identificava perigo. Sentiu uma pontada de orgulho, aquele provavelmente era o botão que prejudicaria sua entrada naquele navio, se não tivesse tomado o cuidado necessário ao invadir.

Rodou os olhos em busca de pistas. Nada.

– Cabine, responda.

Do teto uma voz pareceu emergir.

–  A3 . ativada.

Mavis tossiu – A3, me mostre a situação P7CH-ONP

– Negado – a voz respondeu – Iniciando protocolo de aniquilação.

– O QUE?! NÃO! NÃO! NÃO! SEM ANIQUILAÇÃO SEU, SEU MERDINHA! – Mavis gritou, sua voz era uma mistura de medo e extrema raiva. Perdeu o controle e a voz do comandante havia se perdido em xingamentos.

“O que eu faço? O que eu faço? O que eu faço?” ela pensava, não levantou mais a voz. Não queria piorar a situação. Enquanto isso, o computador da cabine começava uma contagem. Mavis desejou poder entrar no sistema e destruir por completo todo o sistema, mesmo sabendo não ser possível. Passou a mão no alto da testa, sentiu dois pinos arredondados sobre a pele. Caso se desse ao luxo de invadir um sistema tão vigiado estaria liberando o maior sinal possível correria o risco de liberar qualquer sinal. Não tinha certeza quanto a isso, só não podia e nem queria arriscar. Qualquer sinal e naves mercenárias emergiriam a volta.  Já devem estar a procura de qualquer rastro deixado pela nave e mesmo seu melhor trabalho ao hackear e de camuflagem estaria perdido em um piscar de olhos.

– Cancelar! Cabine, cancelar! Cancela toda essa merda!

A cabine parou a contagem e disse – Para cancelar o protocolo de aniquilação, inserir chave magnética em noventa segundos.

Mavis Bo sorriu, havia roubado uma chave do comandante quando o destruiu.

– É isso aí Cabine! – disse enquanto tirava a chave do pescoço – Agora vou colocar essa chavinha bem aqui no buraquinho da chavinha… e ninguém morre.

Uma luz fraca, amarelada brilhou em volta da chave quando Mavis a colocou, ao gira-la percebeu a cabine analisando a chave. Uma faixa de luz amarela correu da entrada da chave em direção ao outro lado da cabine, onde mais uma abertura idêntica esperava. Ela seguiu novamente a luz amarela e tentou retirar a chave do lugar. No primeiro puxão bateu com a mão na cabeça. – Sabia. – disse

Precisava de outra chave, mas onde? Enquanto se perguntava onde poderia estar a segunda chave, a contagem já chegava na metade. Isso a tirava do sério. Saiu da sala para pensar um pouco. Usou a imaginação para criar uma alternativa, como se alguém pudesse guia-la até o local onde uma chave importante como essa poderia estar. Uma mesa, uma caixa, em alguém. Sim, em alguém. Só poderia estar em alguém. “Esses autômatos não são nada originais, Mavis. Não são como você…”

Mas não era tão fácil assim.

Mavis Bo tinha nocauteado o Comandante da nave, assim como todos os robôs dentro dela. Todos desligados. Todos na mesma sala, relativamente longe da cabine, porém se o comandante estava em posse dessa chave, ela não seria menos importante para missão.

“E robôs não usam chave” pensou. Na mesma hora tomou a chave para si. Vendo agora que eram necessárias duas delas para impedir uma aniquilação gratuita, só significava uma coisa.

– Se você não estiver aí dentro eu acabo com você criança. – murmurou enquanto corria novamente até a sala onde havia depositado todos os robôs desativados, inclusive o comandante.

Da sala de comando pode ouvir a contagem marcando quarenta segundos para inserir a segunda chave. Acelerou o passo. Procurou entre robôs aqueles com alta patente, nenhum dos oficiais estava portando uma chave. Um por um ela procurou. Do subcomandante ao último soldado. Nenhum sinal da chave. Quando luzes de alerta começaram a piscar pelas cabines e corredores ela decidiu voltar. Ao lado, um dos primeiros robôs que havia desativado caiu sobre a porta com um som abafado assustando, no entanto esse robô pareceu o sinal de ajuda que tanto precisava.

– Só mais um pouquinho criança humana!! – disse ela indo na direção da sala de comando a toda velocidade. Atrás vinha seguindo um robô meio enferrujado, andava em ziguezague, sinal se falta de calibragem. Mavis o puxou com força para a mesa onde a chave estava.

– Quero uma cópia perfeita, ouviu bem?!

 O robô de manutenção não respondeu, fora feito apenas para executar pequenos serviços de reparos. Aquele era um desafio, mas o tom de Mavis o deixou consciente da necessidade e da pressa. Enquanto isso Mavis apenas esperava um plano tão ruim quanto esse dar certo. O robô de manutenção entregou uma copia da chave, em material plástico, faltando oito segundos para a contagem terminar, fumaça saia de suas entradas e desativou automaticamente.

Mavis inseriu a chave tremendo. Ela entrou. O painel brilhou em amarelo mais forte assim que ela girou a cópia plástica. Mavis sentiu que por pouco não havia travado. As luzes foram as primeiras a da sinal de estabilização, seguido da voz no painel afirmando normalidade. Mavis Bo se sentou ao lado do robô de manutenção completamente apagado, deu tapinhas nas costas dele. Tentou retirar as duas chaves do painel, elas saíram com facilidade.

Saiu da sala de comando. Não queria mais ficar ali. Voltou para a Sala do Pensador e sentou no chão. Ficou olhando o vasto céu por uns minutos, pensando.

“Talvez, essas chaves não sejam a resposta… Talvez a sala de comando não seja a resposta” pensou rindo. Estava cansada de andar, de correr, mas não podia deixar de procurar. Deu uma cambalhota até o outro lado da sala e deu com as costas em uma porta. Tentou abri-la por pura curiosidade e viu que precisava de uma chave. Rindo colocou a chave de plástico e girou, ouviu o barulho de algo destrancando, esfregou as mãos em sinal de entusiasmo. Quando abriu a porta o sorriso em seu rosto desapareceu.

Quando Mavis recebeu o comando para invadir o projeto P7CH-ONP e buscar a criança humana, tinha algo completamente diferente em mente. Por vezes se pegou imaginando situações como encontrar a criança em alguma zona de proteção, campo de vibrações ou até mesmo em um tanque de resfriamento. Não em uma cama. Mas lá estava ela, dormindo como se universo descansasse com ela. Chegou mais perto, procurando assegurar-se de que seus passos eram silenciosos e delicados, não havia necessidade de acordar a pobre garotinha. Sentou-se em uma cadeia ao lado da cama e ficou observando como se aquela criaturinha orgânica fosse sua. Não era, sabia disso.

Sua mente era completo vazio diante da criança. Seu rosto redondo, surpreendentemente corado reluzia a cada suspiro profundo. Os olhos mexiam frenéticos por baixo das pálpebras, Estava sonhando. “Com o que?” Mavis Bo pensou automaticamente. Breve saberia. Ficou assim por quase duas horas, observando os sonhos da garota. Depois que sentiu o perigo se esvair de sua pele, voltou a cabine a fim de analisar o curso, era a ultima parte da sua tarefa e deveria executa-la corretamente.

– Tudo tranquilo por aqui. – disse para o robô de manutenção ao seu lado. Havia ligado o pobre outra vez, dentre todos era o único que merecia retomar a consciência Ele ainda cambaleava, nunca ligou e desligou tantas vezes no dia. Mavis tentava direciona-lo pelo corredor com uma das pernas que havia rasgado de um dos robôs oficiais, quando na sua frente admirando a vista do espaço estava a garotinha. Mavis pode olhar para ela dos pés a cabeça e o susto tomou seu coração gradativamente. Abaixo dos longos cabelos cor de palha, braços biônicos davam lugar ao que deveriam ser os braços de carne de uma linda garotinha, assim como uma das pernas. Quando ela se virou com um sorriso largo e cintilante, Mavis Bo pode ver que um de seus olhos brilhava mais que o normal. Sentiu vontade de chorar, só não saberia dizer se de alegria ou tristeza.

Friendship Inc.

Depois de um dia longo de trabalho, o Amor resolveu tirar a noite de folga. Seria só aquela noite, ele prometeu para si mesmo. Afinal, esse período de poucas horas ativas lhes guardavam, geralmente, a maior carga de trabalho por minuto se comparada aos outros momentos de um final de semana qualquer. No entanto, até os sentimentos mais atrativos e necessários do ser humano precisam relaxar. Momentos de lazer e descontração podem tanto equilibrar a alma quanto reanimar qualquer espírito. Com o Amor não seria diferente. Para tanto seria preciso ter alguém ao seu lado.

“Amizade seria perfeita nessa hora.” pensou suspirando. Poderia passar aquela noite sozinho, como já era de costume, mas aquele era um dia especial. Nada de bancar o platônico solitário.

Começou a busca pela Amizade. Andou pelas por todas as ruas que a vista consegue alcançar. Desde as ruas mais iluminadas até os becos úmidos e ecoantes e nada da Amizade aparecer. Pensou nos possíveis locais onde ela pudesse estar trabalhando, não era comum vê-la de mãos cheias tão tarde da noite, mas também não se surpreenderia caso a visse auxiliando em alguma despedida dolorosa, acalentando os corações com memórias fortificantes. Não só uma despedida. A Amizade celebra muito e em muitas ocasiões diversas.

Observou o relógio de bolso. Sim, o Amor estava em um daqueles dias românticos. Avaliou as horas. “04:27h” leu atentamente. De imediato surgiu imagens de alguma mulher suando e gritando em uma sala de parto qualquer dando a luz ao motivo mais forte de alegria que alguém está disposto a imaginar.

“Nascimentos, são os preferidos dela” pensou o Amor.

Não obstante, o Amor sentou aconchegante no banco mais próximo dentro de um parque bem iluminado bem no meio da cidade. Passou pelo menos meia hora ali. Pensando. Pensando. Pensando. Imaginando quais os tipos de afazeres a Amizade estaria ocupando naquele momento para estar tão longe. Pensou tanto e tão profundamente que não teria notado nem se o chefe do seu chefe, o Sr. das Razões em pessoa, se materializasse ao seu lado.

Quanto mais a pobre Amizade.

“O que você observa com tanta vontade por essa janelinha?” a Amizade perguntou ao Amor com um tom de curiosidade e delicadeza na qual normalmente são oferecidas apenas para crianças ou idosos geniosos.

O Amor sorriu para a Amizade com alívio nos ombros ao respirar fundo – “Desisti de procurar por você pelas ruas e acabei procurando por você dentro de mim.”

“Essa é perfeita para reconciliações, é melhor anotar para não esquecer”

Amizade estava certa. Ele anotou no lenço onde costumava colocar todas as suas ideias súbitas.

“Mas falo sério. Fiquei me perguntando o que estaria fazendo há essa hora.”

“E chegou em algum lugar?”

O Amor fez que sim com a cabeça, sorriu no canto dos lábios e enumerou da seguinte forma.

” As opções são: Partida ou chegada.”

“Errado e errado” respondeu a Amizade “muito comum não acha?”

Ele deu de ombros. Prosseguiu, foi de Nascimentos desta vez, o que recebeu outra negativa.

“Seria perfeito se fosse algo como um Nascimento. É bem do que preciso hoje”

Amizade bufou. Soltou mais algumas reclamações se esparramando no banco ao lado do Amor. Aquilo o intrigou.

“Então não adianta nem eu falar a minha terceira opção. Com certeza não passou a noite com um grupo de crianças jogando algum jogo imaginativo, daqueles de matar os bichos e virar herói de todas as paradas maneiras…” – disse o Amor. Por pouco não ultrapassa o limiar da leve ironia com o deboche.

A Amizade encarnou seu lado mais criança e dirigiu ao companheiro um olhar vesgo. “É meio preconceituoso da sua parte pensar que por ser a agente da amizade meu trabalho é um mar de alegrias e doces emoções.”

“Não é?” respondeu o Amor acompanhado de um sorriso maldoso “No meu trabalho é só flores e chocolates”

Dois segundos de silêncio depois os dois soltaram uma risadinha fraca, porém sincera.

“Nada como sorrir da desgraça” disse o Amor “Mas me diz… é muito ruim?”

Ela ponderou por longos minutos buscando as melhores palavras para começar a descrever seu maior trabalho do dia. Quando entendeu mais ou menos o ponto de partida esticou o braço e caiu com a mão direita sobre o ombro do Amor, que por sua vez foi tomado por uma visão diferente da de poucos segundos atrás. O parque, com seu banco de ferro, plantas diversas e iluminação forte ficava cada vez mais distante a medida que avançava para frente como em alta velocidade sem sentir sair do lugar. Apenas sua mente viajava pelo espaço quase infinito de ruas, paredes, céu, esquinas, valetas e estradas. Quando já não conseguia mais distinguir o que era cima ou baixo, e os lados se mostraram alinhados, conectados na forma de um túnel infinito para frente sentiu a extrema necessidade de vomitar e por pouco não o fez.

Piscou algumas vezes para se acostumar com a claridade do dia. Mesmo a meses de distância pode ouvir a voz da Amizade com perfeição na clareza.

“Está vendo essas duas garotas sentadas conversando?” ela orientou. O Amor fez que não com a cabeça. Havia pelo menos três duplas de jovens mulheres sentadas conversando a sua volta. Sem falar nos grupos mistos onde as moças poderiam muito bem estar desfrutando de conversas de formas separadas.

“Se concentra um pouco! Bem ali no canto, onde ficam as cadeiras mais confortáveis do restaurante. Uma veste um macacão violeta, tem cabelos curtos cheios de cachos da cor de terra molhada e a outra..”

“Com vestido florido e de cabelos bem lisos! Achei!” disse o Amor em clima de investigação. “o que tem elas?”

“Quero que as observe um pouco”

E foi o que o Amor fez.

As duas, sentadas uma de frente para outra, pareciam alegres ao conversar. A de cabelos cacheados saboreava um prato com carne e batatas. Salada e suco para outra. A de cabelos lisos saboreava sua salada enquanto ouvia a de cachos falar entusiasmada sobre algo. O Amor pensou em chegar mais perto. A curiosidade sobre o que a moça poderia estar falando o levou a caminhar, se pôs de frente para as duas. Atravessou a mesa, cadeiras, comida e tudo sentando-se ao lado delas.

A garota entusiasmada de cachos infinitos contava algum tipo de sonho louco ou uma história digna de receber um bom e elaborado roteiro de cinema.

“Não há nada de errado aqui” afirmou o Amor. “Ao que parece é um bom dia para essas duas. Apesar de uma não para de falar, o que ela diz é bem convidativo e interessante o bastante para manter a outra interessada. Na verdade, até eu estou um bocado interessado no desenrolar dessa cabecinha imaginativa.”

Amizade apareceu diante do Amor como um sopro em sua orelha. Apontou para as duas repetidas vezes, em seguida estendeu os braços ao companheiro de trabalho. O Amor deu com as costas para trás da cadeira acolchoada como se quisesse se livrar de alguma maldição jogada pela Amizade.

“Você não vê?! Essas duas estão a ponto de nunca mais se falarem outra vez!”

O Amor caiu para trás de susto. Aquilo era demais até para ele. “É isso que dá ficar saindo toda semana com aquelas emoções terciárias. Você começa a analisar demais quando na verdade está tudo numa boa.”

“Por acaso EU não te ensino a fazer o seu trabalho, senhor que mal tem dividir apartamento com o Medo, coitadinho dele?! “

Bom, o Amor não tinha resposta para aquilo. Hospedar o Medo não foi lá a ideia mais inteligente.

“Escuta, esse é um relacionamento de amizade tipo um! Relações assim estão a beira da extinção! Já são quinze anos trabalhando nessas duas e só de pensar em tudo isso acabar… Ah! Vamos procurar algum bebê nascendo por aí, vamos?”

A pobre Amizade estava literalmente derretendo de desânimo quando o Amor a segurou pelas mãos.

“Ei, não fica assim. Você é forte, inteligente. Vai achar uma saída para esse problema.”

“Já não tenho tanta certeza. Essas duas parecem querer se separar, só dificultam meu serviço”

“Para começo de conversa, se endireita! Isso, muito melhor. Levanta os ombros e respire fundo. Quando eu estou pra baixo assim como você recitar o lema da empresa sempre ajuda a me animar”

Amizade olhou desacreditada para o companheiro. Se tivesse energia tiraria boas risadas, mas na atual conjuntura o que não acrescentasse também não afetaria.

“Formar, auxiliar, retribuir. Formar, auxiliar, retribuir. Das relações sou consequência, das pessoas natureza. Formar, auxiliar e esperar o retribuir.”

Em cada frase um longo suspiro se seguia.

“Elas são novas demais para o retribuir, o que nos resta apenas nos esforçar no auxílio.” disse o Amor. Aquilo deixou a Amizade curiosa.

Nos resta? Vai entrar nessa briga também?”

Antes de responder, o Amor deixou escapar uma risada leviana enquanto ajeitava o colarinho.

“Eu não sei o grau de raridade de uma amizade tipo um, ou o quão complicada parece a restauração dessa bagunça, mas de uma coisa eu sei. Tudo, tudo melhora com uma pitada do Amorzinho.”

“Você é ridículo as vezes.” disse a Amizade sorrindo levemente “É por essas e outras que a Raiva não quer te ver nem pintado de ouro”

Ele deu de ombros. “Vamos lá. Me explica melhor então a situação.”

A Amizade assentiu com a cabeça. olhou determinada para as duas garotas. A de cabelos cacheados terminara sua história e as duas agora dividiam a atenção entre pequenas falas entrecortadas pelos respectivos pratos. O Amor notou que os olhos da Amizade lacrimejavam só em observá-las.

“O silêncio é ruim para a Amizade?” perguntou ingênuo.

“Não necessariamente. Mas vê, não sabem mais aproveitar o silêncio entre elas. Antigamente essas duas viviam falando. Em todos os lugares! Não calavam a boca, e ainda assim tinham ótimos momentos de silêncio. Não havia necessidade de preencher um vazio porque o silêncio não representava um vazio em si. Entende?”

“Acho que sim.”

“Amizade tipo um é a mais rara porque é a única, em todas as listas e mais listas de escalas, cuja formação é independente de mim.” – deixou escapar docilmente. Amizade fez parecer como se dividisse com o Amor um segredo há muito escondido.

“Espera um minuto. Está me dizendo que você não tem nada a ver com essas duas serem amigas?”

A Amizade balançou a cabeça “Claro que depois de iniciada eu trabalhei, e venho tentando desde então mantê-la. Nisso é como qualquer outra relação de amigos formada por mim desde o início. Mas na formação, no nascimento, não… ela veio sozinha. Independente do meu agir. Ela se construiu pela vontade delas em se tornarem amigas”

O Amor levantou os braços de sobressalto. “Que viagem!”

A Amizade abriu as mãos em consideração. Inclinou o corpo para frente e apoiou a cabeça com a mão direita.

“São mais de dez anos de estrada juntas. Até então nunca senti que poderia perder essa duplinha. Agora, olha só pra isso. Enquanto uma tentava preencher a falta de emoção no encontro com algumas histórias imaginativas a outra não parava de balançar a perna por baixo da mesa. Ao se encontrar mal se abraçaram. Tudo bem, elas nunca foram de abraçar muito, mas ainda assim! E agora não param de mexer nos celulares! Como eu odeio celulares!”

“Jura?! Eu gosto bastante. Tem sido um bom parceiro para mim. Sabe como odeio criar papinhos iniciais às vezes, e o celular impulsiona a conversa no meu lugar quando não estou muito inspirado.”

“É por isso que ultimamente seus relatórios estão cada vez mais insatisfatórios” pensou a Amizade, revelaria isso depois com certeza.

“No meu caso mais atrapalha que ajuda” disse. Porém, o Amor não ouvia nada. Seus olhos estavam atentos ao celular.

“Olha isso Amizade, eu conheço essa moça de cabelos lisos! Nossa como ela mudou!”

A Amizade pouco entendeu a situação e resolveu deixar o companheiro continuar.

“Lembra daquela garota que só me dava dor de cabeça?! Tem quase um ano isso.”

“Acho que sim, talvez. Tá falando da menina que quase se apaixonou três vezes?”

O Amor assentiu vividamente. Apontou para o celular “Parece que o quarto vingou.” Ele leu alguns minutos da conversa e depois se voltou diretamente para o rosto da menina de cabelos lisos ” Sério, número quatro? Tá de brincadeira comigo, mocinha?! Esse cara é um mala! Só coloquei ele no seu caminho para ver se o seu problema era autoestima!”

“Bom” disse a Amizade buscando o tom da sabedoria tibetana “as vezes o coração quer, o que o coração quer”

“E às vezes o coração quer um grande mala sem alça chorão pra chamar de seu” completou o Amor na mesma serenidade irônica.

A culpa os fez parar de rir alguns minutos depois. Foco, precisavam de foco.

“Eu estava olhando aqui do meu cantinho” disse o Amor ” Elas são muito diferentes, certo?”

“Como água e vinho” respondeu sorrindo a Amizade “Como água e vinho.” Apontou para a de cabelos lisos “Vê como é vaidosa?”

O Amor fez que sim com o dedão. “Lembro bem, só de bolsas essa daí provavelmente perdeu a conta.”

Amizade soltou uma risadinha para a de cabelos lisos, que levantou justamente para ir ao banheiro retocar a maquiagem. A de cabelos cacheados puxou uma mochila escura até o colo procurando o que parecia um caderno pequeno.

“Por outro lado, faz oito anos que essa mochila a acompanha na vida.” – falou Amizade com satisfação.

“Oito anos com a mesma mochila?” disse o Amor diretamente para a moça.

“Cada rasgo aumenta mais a afeição. Praticamente uma companheira” – Era o que a moça diria ao Amor se tivesse a chance. Respondeu Amizade “Essa é minha parte preferida nisso tudo. Tão diferentes e ainda assim se dispuseram sozinhas a criar um laço de amizade tão puro.”

O Amor analisou a expressão no rosto da Amizade. Aquilo a preenchia tanto quando um casamento às pressas ou bodas de ouro preenchiam seu coração. Tanto quanto o Eu te amo de uma mãe para um filho”

“Vai fazer de tudo para manter essas duas unidas não é?”

“De tudo e mais um pouco” respondeu a Amizade “Hoje elas seguem caminhos completamente opostos e por vezes me dói ver que nem sempre elas valorizam as escolhas da uma da outra. Tem momentos que os defeitos são exageradamente acentuados aos olhos de cada uma quando o as personalidades se chocam, mas sei que a dor que sinto é mil vezes maior dentro delas quando pensam nas inúmeras possibilidades em que a vida as separa súbita ou gradativamente.”

O Amor suspirou. Disso entendia muito bem.

“Vou te ajudar no que tiver ao meu alcance, mas não se esqueça. Não podemos afetar o livre arbítrio de ninguém.”

“Sei disso, sei disso… mas não custa nada relembrá-las certos acontecimentos importantes vez ou outra. Nem que sejam apenas as piadas recorrentes ou os choros, os momentos de perda onde uma estava do lado da outra.”

“Claro, isso é perfeito. Vou dar uma mãozinha também, um pouco de carinho sobre lembranças sempre ajudam os humanos a se procurarem.”

“Boa ideia” disse a Amizade sentindo um pouco mais reconfortada. “Quem sabe assim, aos poucos, essas duas reconstroem a aquilo que o Tempo vem desmontando.”

“Afinal, elas começaram essa empreitada sozinhas. Vão conseguir entrar no eixo novamente.”

“Sim” respondeu a Amizade.

“Você mencionou o Tempo… e se tudo isso foi culpa dele?” jogou o Amor. “Às vezes a imparcialidade do Tempo não te irrita?”

A Amizade coçou a testa por uns segundos, o Amor adorava quando ela entrava no modo pensativa. Não sabia o porque, sempre que a Amizade ou coçava a cabeça ou inclinava o rosto em pensamento se sentia estranhamente feliz.

“Não posso negar. Às vezes o Tempo atrapalha meus planos. Mas o que podemos fazer? Discutir com o Tempo é como advogar em águas internacionais.”

O Amor teve de concordar e sem que os dois percebessem as duas amigas levantaram e se dirigiram para a saída do restaurante. A de cabelos cacheados retirou um pacote da mochila.

É pra você – disse desajeitadamente – Encontrei em uma livraria bem escondida no centro da cidade. Tentei embrulhar, mas sabe como é…

A de cabelos lisos recebeu o presente com ar de curiosidade e o abrir o pacote se derramou em lágrimas.

Como você achou?! – ela perguntou.

Sei lá… só garimpei por aí. Não foi tão difícil quanto pensa.

Não foi difícil o caramba! Procurei ele há pelo menos cinco anos! E está perfeito! Exatamente como quando eu perdi.

Bom, vê se não perde dessa vez. – disse a de cabelos curtos rindo.

Espera, eu tenho algo para você também…

“Espera um pouco” disse o Amor “o que está acontecendo?! Me perdi”

A Amizade sorria e gargalhava aliviada. “O inesperado” ela respondeu “outra vez”